Moisés


Queria contar pra vocês minha história com um rapaz chamado Moisés.
Moisés tem entre 20 e 21 anos. Ele deve ter 1,8m pra mais, é esbelto e bem bonito. Conheci Moisés no final do ano passado voltando a pé da UFRJ depois de ter bebido umas cervejas.
No nosso primeiro encontro Moisés puxou minha bolsa e em seguida me acertou um soco na cara. Nosso diálogo foi rápido e intenso:
"Não reage, não fala nada"
Enquanto corria eufórica atrás dele, desferi as palavras:
"Por que você tá fazendo isso?"
Nosso único diálogo.
Moisés morou na minha cabeça durante alguns dias. A sensação? Algo entre cuidado e angústia.
Moisés foi preso na mesma noite e eu precisei pegar minha bolsa e documentos na delegacia. Minha primeira noite de insônia pensando nele deu vida a uma cartinha que escrevi a mão.
Fortuitamente ou não essa carta nunca pôde ser entregue.
Tive, então, meu segundo encontro com Moisés em uma sala de reconhecimento. O medo de ser vista só era superado pelo desejo de entrecruzar as vistas. Nesse dia eu desabei.
Moisés sumiu de mim durante um tempo. As marcas do soco sumiram e a história se tornou engraçada.
Hoje, no entanto, tive meu terceiro encontro com Moisés. Um lugar de engravatados, rostos sérios e tristes. Uma oficial de justiça bateu minha porta e de súbito Moisés voltou como um sonho estranho.
Ao caminhar pelos corredores o coração palpitou. Estava eu decidindo a vida de Moisés? Eu, que bêbada, sozinha e de cara a tapa, que troquei seis palavras ao correr atrás de coisas e que perdi horas lembrando do seu rosto estava decidindo sua prisão ou liberdade?
Moisés não me deu só um soco como me puxou a orelha e talvez o pé. Moisés foi um lapso consciente que brotou no meu coração e me atordoou.
Mais uma vez numa sala de reconhecimento eu olhei pra Moisés e ele não me olhou. Mais uma vez eu revivi a sensação afobada de carinho versus angústia. Mais uma vez eu me coloquei contra a bondade que existe aqui dentro e escutei a voz do temido "tem que ser feito".
Algo em mim chora sem saber exatamente o porquê, algo em mim é apatia e algo em mim é dúvida. Me parece que vivi a despedida de Moisés e isso não me faz mais tranquila ou segura.


[Retrospectiva: Se apaixonar parece ser assaltada]

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